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Gestão RH – Como surgiu seu interesse pelo treinamento de lideranças?

Peter Barth – Meu interesse pelo tema liderança remonta à minha adolescência e juventude, quando fui monitor, depois guia e, fnalmente, chefe de escoteiros. Naquela oportunidade descobri a importância de liderar pelo exemplo e percebi o impacto que uma liderança efcaz tem sobre o desempenho, o comprometimento e a satisfação dos membros do grupo. Foi por esta razão que me interessei pelo estudo da psicologia. Aprendi, na prática, que quando o líder não cumpre seu papel a contento, os resultados são ruins, cai o moral do grupo e começa a ocorrer a evasão dos membros. Quando o desempenho do líder é positivo, conseguemse realizações extraordinárias mesmo em condições adversas.

Gestão RH – Quais foram as principais mudanças ocorridas na formação de líderes nestas cinco décadas?

Peter Barth – Há 50 anos, o tema desenvolvimento de lideranças era considerado um luxo, uma sofsticação que algumas poucas empresas, principalmente multinacionais, colocavam em prática. Nos anos mais recentes, um número crescente de empresas já percebeu que, se não investir no desenvolvimento de lideranças, estará comprometendo sua prosperidade e até mesmo sua sobrevivência. Portanto, o que era opcional, tornou-se básico. Também era uma época em que os participantes se interessavam bastante pelos fundamentos teóricos e conceituais dos modelos apresentados e questionavam se o que era válido para os Estados Unidos seria válido para o Brasil. Hoje, os participantes e a empresa que contrata o treinamento querem saber se os conceitos e ferramentas funcionam na prática e se podem ser aplicados imediatamente. Já existe um número crescente de empresas que compreende que, se o treinamento não tiver continuidade, sustentação e reforço, irá diluir-se no tempo e os resultados serão grandemente reduzidos.
Começa a consolidar-se o entendimento de que trata-se de um processo, e não apenas de um evento. Ao longo destes anos houve um aumento gradual da parcela de empresas preocupadas com o ROI (retorno sobre o investimento) do treinamento, o que considero extremamente saudável. Não é tão importante o número de participantes treinados e a quantidade de horas de treinamento que cada funcionário recebe por ano, mas sim o que mudou após o treinamento e de que forma esta mudança está alinhada com as necessidades e os objetivos previamente identifcados. Se há algumas décadas menos de 1% das empresas estavam dispostas a investir no cálculo do ROI, hoje já temos entre 7 e 8% fazendo isso. É pouco ainda, mas, sem dúvida, há um progresso considerável. Creio que o principal motivo para estas mudanças citadas é o aumento da competi- ção e a própria velocidade das mudanças no mundo dos negócios. Hoje, as empresas que não quiserem fcar fora da corrida têm de fazer cada vez mais com cada vez menos, e já está comprovado que a liderança efcaz está diretamente relacionada com o aumento da produtividade, da lucratividade e com a conquista de uma crescente participação no mercado.

Gestão RH – Em se tratando de gestão de pessoas, quais atributos essenciais deve ter, especifcamente, um líder de RH?

Peter Barth – Primeiro eu gostaria de questionar a pergunta, pois ela sugere que a gestão de pessoas seja atribuição do RH. Na verdade, a gestão de pessoas é atribuição de cada gerente, supervisor ou líder da organização, independentemente de sua área de atuação ou de seu nível hierárquico. É por causa deste conceito equivocado que temos tantos problemas e difculdades na gestão de pessoas. Antigamente, havia quem achasse que um gestor de uma área de produção ou vendas, por exemplo, era responsável apenas pelos aspectos técnicos de seu trabalho e pela obtenção de resultados. Portanto, se ele fosse bastante qualifcado na parte técnica, ele teria plenas condições de ter um bom desempenho como gestor. Esta dicotomia entre pessoas, de um lado, e resultados, do outro, gerou bastante desgaste e prejuízos vultosos. Hoje, sabemos que um gestor é responsável por pessoas e resultados. Assim, todo gestor é também um gestor de RH, no sentido de ser um líder de pessoas. Para liderar pessoas efcazmente, um gestor deve considerar que além de obter resultados, algo pelo que todos os gestores são continuamente cobrados, ele precisa também obter um alto nível de engajamento e comprometimento de seus colaboradores. Somente alguém que, além de obter resultados e atingir objetivos, também consiga manter uma equipe motivada, engajada e comprometida, poderá ser considerado um líder realmente efcaz. Lembrem-se: resultados e pessoas! Portanto, além das habilidades técnicas requeridas e que, à medida que um gestor sobe na organiza- ção, tendem a ser substituídas por habilidades estratégicas, os lideres precisam aprimorar suas habilidades de comunicação, ter empatia, dar e receber feedbacks… Enfm, possuir aquilo que muitas vezes se convencionou chamar de “Inteligência Emocional”.

Gestão RH – O que devem fazer as organizações que buscam formar seus líderes?

Peter Barth – Em primeiro lugar, evitar deixar as coisas ao acaso. Se por um lado existem algumas pessoas que demonstram por si só maiores habilidades para a comunicação, motivação e demonstração de empatia do que outros, todos podem benefciar-se por ter acesso a conceitos e ferramentas de efcácia comprovada. Ao treinar seus lideres em metodologias reconhecidamente efcazes, a organização sobe o patamar de desempenho dos gestores. Os bons tornam-se ainda melhores e os medianos também melhoram seu desempenho. O que temos observado é que a curva da distribuição estatística se move para a direita com um aumento signifcativo da média do desempenho. Quero aproveitar para alertar as organiza- ções para um fato de alta relevância: mesmo o melhor método de treinamento do mundo, se for ofertado em uma única oportunidade e não tiver sequência, continuidade e sustentação, tende a cair no desuso com o tempo. É preciso gerenciar o processo e planejar desde o come- ço atividades de reforço e reciclagem para manter o valor do investimento feito. É preciso que a organização demonstre claramente desde o começo que a nova ferramenta deverá ser usada na prática. Não se trata de algo opcional. Portanto, é preciso reforçar, avaliar e medir os resultados. Ken Blanchard sempre diz: “You get what you inspect”. Você obtém aquilo que você cobra.

Gestão RH – Qual é o maior desafo dos líderes organizacionais nos dias atuais?

Peter Barth – Várias pesquisas realizadas pelas empresas Ken Blanchard têm demonstrado que existe uma forte correlação entre altos índices de satisfação de colaboradores e de clientes, e que ambas as medidas estão relacionadas às práticas de liderança. A conclusão óbvia é que as boas práticas de liderança fazem a diferença. Organizações que não aprimoram suas práticas de lideran- ça sofrem perdas crônicas de produtividade que arrastam os resultados para baixo. No mundo competitivo de hoje, com mudanças em ritmo cada vez mais acelerado, cada organização necessita que cada um de seus membros trabalhe em seu nível máximo de criatividade, inovação e busca da excelência. Não podemos mais nos dar ao luxo de apenas buscarmos bons resultados. Precisamos de resultados cada vez melhores que se sustentem com o tempo, apesar das adversidades. Isto só será obtido se tivermos uma força de trabalho altamente engajada, que tem verdadeira paixão pelo que faz. Uma liderança verdadeiramente efcaz permitirá às nossas organizações se tornarem e se manterem como fornecedores favoritos dos clientes, empregadores favoritos dos colaboradores e investimento favorito dos acionistas. Desta forma, todos sairão ganhando: os clientes, os colaboradores, os acionistas e a própria comunidade. O que não podemos é incorrer no altíssimo custo de não investir no desenvolvimento de lideranças.

Peter Barth

Peter Barth é psicólogo organizacional, Master of Science in Management. Foi professor da EAESP-FGV e da FGV-RJ, totalizando 13 anos de ensino acadêmico. Nasceu na Suiça e reside no Brasil desde 1946. Atua há 55 anos em consultoria organizacional, treinamento e educação corporativa.